segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Fotografia é arte?

Por Flavio Colker

Self portrait/Mapplethorpe
Cindy Sherman, 1977
JORGE SAYÃO ESTÁ NOS ESTADOS UNIDOS COMO VISITING RESEARCHER na Brown University e na Rhode Island School of Design, aonde pesquisa para escrever sua tese de doutorado sobre Giorgio Morandi e sua influencia na arte brasileira.

O conheci em seu curso sobre a natureza da arte e suas diversas definições, na EAV.

Até pouco tempo atrás, o fotógrafo não era um artista contemporâneo. A fotografia tinha o seu escaninho separado da arte. A arte fotográfica era algo atrasado, utilitário, romântico enquanto as artes plásticas lidavam com pensamentos mais densos. Mapplethorpe foi o primeiro a ter cotações em pé de igualdade com alguém que se denomina artista. Após ele, uma geração de alemães, belgas, americanos e brasileiros, emergiu enquanto “fotógrafos” dentro do Mercado.

Jorge estuda a expansão da arte e a incorporação de novos objetos ao seu campo. Logo, caberia a ele a pergunta: O fotógrafo faz arte?

Flavio Colker – Jorge, como você vê a valorização da fotografia dentro da arte?

Jorge Sayão – A arte é uma materialização do real, de idéias. A obra carrega idéias. Há uma tendência a ficar impressionado com a tecnologia que produz a obra mesmo que idéias antigas estejam sendo veiculadas. Isso em vídeo acontece com mais freqüência do que na fotografia. Essa é uma avaliação equivocada. Arte é o meio. Não há distinção entre forma e conteúdo, mas forma apenas, não significa valor. A fotografia, por estar ligada à representação, sofreu rejeição na arte, mas desde a pop art, ela e outros objetos vulgares começaram a ser reintroduzidos na arte.

Flavio Colker – Antes um artista utilizava a fotografia para produzir arte, enquanto o fotografo não tinha esse privilegio. Hoje, o fotografo passa ser vendido com o mesmo valor de mercado do artista. Fotografo= artista. Antes dos anos 80, fotografia era um meio absolutamente distinto da arte.

Jorge Sayão – A Funarte, por exemplo, tinha salas para fotografia e outras para a arte.

Flavio Colker – Então como é que fotógrafos passaram a ser assimilados como produtores de obras de arte?

Jorge Sayão – A partir da intencionalidade. Algo é feito para ser arte e não outra coisa. Poderia ser uma fotografia de moda, por exemplo, mas foi feito para ser arte, por um artista que sabe o que é arte, para ampliar a noção do que seria um objeto de arte. Essa expansão é uma condição da arte. Logo, a arte abre espaço para objetos que são produzidos com outros valores formais, desde que tenham a intencionalidade de ser arte.

Flavio Colker – Talvez essa passagem tenha começado com Mapplethorpe.

Jorge Sayão – Mapplethorpe foi o primeiro a ter fotos com valores de mercado equivalentes à pintura.

Flavio Colker – Parece, inclusive, que houve manipulação no mercado para se atingir tais valores.

Jorge Sayão – Não seria a primeira vez. O artista pode fazer o inverso também: trazer características do objeto de arte para dentro de uma revista de moda. Esse também é um ato de artista: instaurar um espaço de arte dentro de outro meio criando uma estranheza. Um parafuso dentro do sanduíche. A estranheza explicita os valores do meio, o que fica oculto. Amplia a consciência.

Flavio Colker – Sim! Eu diria que os ambientes vulgares como a revista e o cinema estiveram abertos a absorção de valores artísticos. A influência do surrealismo no cinema americano, do minimalismo nos retratos feitos por Richard Avedon. O surrealismo, aliás, é uma grande influencia fora do Brasil. Por que o Brasil rejeitou o surrealismo?

Jorge Sayão – O Brasil optou por uma arte construtiva. Havia uma vontade de construção. O surrealismo tem um caráter bélico, de maquina de guerra. O Brasil não teve a experiência da primeira guerra mundial.

Flavio Colker – Nem a America teve a experiência. Acho que passa pelo capitalismo, pela industrialização. Os surrealistas foram para América com o plano definido de serem abraçados pela indústria. Dali declarou que estava na América para isso.

Jorge Sayão – A Rosalind Krauss diz que a obra surrealista é antes de tudo a revista e não a pintura, a música e o poema. Os surrealistas desprezaram o ambiente de arte e foram para a geral: criaram o que conhecemos como valores artísticos dos meios de comunicação. O cinema brasileiro sofre com a ausência de surrealismo. Cinema é maquina de imagem. Os surrealistas entenderam a imagem como ninguém. Pensa em Terminator; Schwartzneger de Cyborg numa Harley Davison. Imagem.

Um comentário:

  1. Ah, sim...o lance do surrealismo. Agora entendo melhor o Helmut...não há nada de surrealismo no Sebastião Salgado, há? Gostei do que o seu entrevistado disse em relação ao cinema brasileiro ter sofrido com a falta do surrealismo. Não consigo ver nenhum filme do Arnaldo Jabor...gosto do Lynch, ele entendeu o surrealismo, eu acho. O que é aquele filme "Uma história real"? Um velho do interior que dirige um trator para visitar o irmão que mora a não sei quantas estradas de distancia. Isso é imagem.

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